sexta-feira, 4 de novembro de 2011

ASSUAN

Aportados em Assuan, logo fomos levados pelo incansável Saladino a   correr a região de carro e visitar a antiga barragem Assuan I , idealizada pelas ingleses no inicio do século XX e cuja primeira etapa foi finalizada em 1912. A via que leva de uma a outra ponta da barragem tem cerca de 2 km. Paramos sobre a ponte, para apreciar a obra e a natureza, ou o que restou dela.

Esse trecho termina numa área militar, muito bem guardada por policiais fortemente armandos, e há barreiras para revista dos carros e pessoas. Sabe-se da importância e necessidade destes cuidados, na preservação de uma obra estratégica, como aquela.


6 kms rio acima foi construída a segunda represa, tendo formado o famoso lago que levou o nome do então Mandatário do Egito Gamal Abdel Nasser. O Lago Nasser, com 500 km de extensão encontra-se parte no Egito e parte no Sudão e controla a vazão do Rio. A sua construção e a consequente mudança do fluxo das águas, alterou a milenar regularidade da fertilização das terras que corta, forçando os ribeirinhos rio-abaixo a usar fertilizantes químicos. Considerando-se que o povo Egipcio sobrevive em razão das benesses do seu único e famoso curso d´agua, penso que eles correm sérios riscos de perda, ao menos parcial, desta importante fonte de riquezas.
Depois de visitarmos essa grande construção do século XX, seguimos para um ancoradouro


 e embarcamos rumo ao Templo dedicado a Isis , na Ilha Filae.



Vale ressaltar que com a inundação provocada pelo enchimento da primeira barragem, a ilha e o templo ficaram parcialmente submersos, mas com a construção da segunda, desapareceriam totalmente. Então , uma campanha da UNESCO ganhou força e vários monumentos foram transferidos de lugar, incluídos os da  Ilha Filae. O templo foi removido para  60 metros acima, na Ilha Agilika. A sua recolocação num ponto mais alto e seguro, foi feita com cuidados , mas deixou marcas. O piso encontra-se forrado de tábuas  para evitar que se deteriore.


Em alguns pontos está visível o cimento usado para a religação das várias  partes.
Pela sua situação, tão próximo da água é um lugar aprazível e sobretudo belo. Só  o azul do céu seria suficiente para iluminar o  cenário e dar o colorido que  o destaca. Os barcos despejam os visitantes junto ao prédio mais antigo do complexo, o pavilhão de Nectanebo I, datado do século quarto antes de Cristo. Esse é ligado ao templo principal por um pátio sustentado por grossas e majestosas colunas.


O faraó homenageado foi o mesmo que iniciou as obras.  O complexo compreende templos dedicados principalmente a Isis e a Hathor. Reza a lenda ou os mitos e crenças do antigo Egito,  que Seth (com forma de crocodilo, é um dos deuses do mal) matou seu irmão Osiris, esposo de Isis, esquartejou-o e espalhou seus restos ao longo do Nilo. Isis saiu reunindo as partes do corpo  do marido, tendo finalmente encontrado seu coração na Ilha Philae. Já Hathor, teria sido enviada por Amon, seu pai, para em forma de leoa, destruir tudo o que visse pela frente. Ela cumpriu tais ordens, e finalmente exausta e com sentimento do dever cumprido chegou em Filae e ali adormeceu.  Assim, os templos da pequena ilha, foram dedicados a essas duas entidades, que pelo visto os protegiam bem, porque eles permaneceram abertos e intocados  durante a  conquista romana e até os primórdios do cristianismo.
Naquela não houve censura aos seguidores da religião egípcia. O  próprio  Imperador Trajano agregou um quiosque às constuções do complexo, quiosque esse que lembra o pequeno templo de Erectéion, junto ao Pártenon em Athenas. Já no cristianismo com a alegação de que havia uma relação entre as figuras de Isis e da Virgem Maria o templo foi dos poucos que se manteve aberto. No entanto, no século V da era cristã, devido a o acirramento da intolerância religiosa  esses se transformaram em igrejas e muitas das figuras de faraós e deuses da antiga cultura foram desfigurados.
As construções  ali existentes e tão preservadas para deleite dos visitantes são o quiosque de Nectanebo I, que já comentamos, e  o templo de Arenshuphis. Na sequência,  carreiras de  belas colunas,  orientais e ocidentais fazem a ligação aos pórticos , chamados pilonos. 

as capelas e aos templos de Isis, Horus e Hathor. Há ainda o Nilômetro, o quiosque de Trajano e o Portal de Diocleciano.
Ressalte-se que o ponto mais repousante do passeio é o local onde está esse último  pavilhão, pois fica a  beira da água e possui belas plantas.
  

Retornando do agradável passeio, fomos até as pedreiras onde eram retirados os granitos para as esculturas e os belos e eternos monumentos faraônicos. No canteiro ainda existe um grande obelisco, que pesa cerca de uma tonelada e mede 41 metros. Seria dos maiores entalhados no Egito, no entanto uma grande fissura aconteceu durante a escultura, o que impediu a seu deslocamento. Ele se encontra lá  como testemunho de uma época gloriosa...através dos séculos. Que coisa impressionante!

Ao anoitecer nos depedimos de Saladino. Ele voltou a Lúxor para acompanhar sua mulher, na semana do parto de mais uma filha. Eu sempre ficava pensando como seria o convívio conjugal numa casa islâmica. Saladino sempre andava impecável, as suas roupas ocidentais (camisa e calça de trabalho) eram muito limpas e bem  passadas. O que revela uma mulher carinhosa e zelosa. Uma dona de casa. Da parte dele antevia-se um chefe de família, presente, atencioso com a esposa e filhos. Trocamos mostras de fotos, eu dos meus filhos, noras e netos e ele das crianças dele. Quando se dirigia a sua familia o fazia com  muita ternura. Então me parecia que era possível deixar de lado as crenças e ideologias para,  despido destas armaduras, deixar aflorar o ser humano, em busca do objetivo comum, a felicidade. Uma boa descoberta! Mas esta visão da casa islâmica me levou aos meus  tempos de criança, com a mãe dona de casa , o pai provedor, uma grande família com avós e tios por perto.
Eu acho que sou muito emotiva pois sempre ficava nostálgica a cada despedida.. Deu uma pontada de tristeza a separação, após dias de convívio tão fraterno. Lembrem-se que Toninho adoeceu e tivemos toda a sua solidariedade, assim como do motorista Ahmed (um grandalhão, loiro).
Na manhã seguinte , logo após o café, já ancorados em Assuan, fomos chamados pelo novo guia, o jovem e politizado Amro de 28 anos). Chamou-nos pelo interfone para uma reunião na sala principal.  Sentou-se diante de nós, apresentou-se com um discurso solene, deu muitas instruções e orientações. Depois nos liberou, como se fossemos escolares. Acho que isto tudo foi para impor respeito em razão da pouca idade. Mas ficamos meio zonzos e eu contive o riso, pelo modo impositivo e  engraçado como ele colocou as coisas.
Na hora aprazada descemos da nossa cabine e caminhando pela Corniche, fomos em busca da nossa faluca.


O sol estava escaldante como sempre. Enfrentar o calor diretamente debaixo daquele sol seria uma maratona penosa. Mas logo após o embarque o calor cedeu lugar a uma brisa  fresca e reconfortante.  As falucas, embarcações utilizadas desde o tempo dos faraós, hoje estão mais modernizadas. A que nos transportava era ajudada no impulso inicial, por um motor de popa. O barco era largo, os bancos forrados de tapetes coloridos.


 Depois de desligar o motor  e içar velas o barco passou a deslizar suavemente pelas águas calmas   da represa. Estávamos acompanhados do novo guia e pelo barqueiro ( faluqueiro?).  Poucos minutos de navegação já vislumbrávamos no lado oeste  do Nilo a elevação onde estão os túmulos dos nobres.

Aportamos na Ilha Kitchner (nome dado em homenagem ao seu proprietário e fundador Lord Horatio Kitchner, Cônsul Britânico no Egito). Recebu a Ilha de presente pelas suas incursões militares no Sudão. Ele era fanático por jardinagem e importou árvores  e palmeiras de todas as partes do mundo, inclusive do Brasil. Vimos ali o  pau-brasil. Mas o que dava um vivo colorido era a vista de nossas inigualáveis primaveras,


(Bougaimvilea) que exportamos para aquele lado do Mundo, inclusive para a Grécia e todo o Mediterrâneo. Amro nos deixou livres para usufruimos do jardim das maravilhas (lembrei do Aladin, o da lâmpada).


  Cruzamos devagar seguindo pelos passeios. Aqui e acolá esbarrávamos com grupos de escolares em aula,  ao ar livre,  e estudando as folhas e plantas. Onde tem crianças e adolescentes sempre tem o burburinho e a expansividade natural da idade. Toninho fez a festa, como agrônomo e grande conhecedor de árvores ia me explicando:..aquela palmeira é da Indonésia...., aquela outra típica da Nova Zelândia... veja ali o Sicômoro (árvore já usada em túmulos e muitos outros objetos,  pelos faraós e que permanecem até hoje. A exemplo , a barca sagrada de cinco mil anos,  construída desta madeira e que se encontra exposta ao lado da pirâmide de Quéfren).


 Do outro lado nos aguardava o guia,  que  falou sobre o túmulo de Agha Khan III,líder espiritual dos Ismaelita. Milionário ficou conhecido pela vida de luxo e ostentação no Ocidente e pela participação nas festas e  colunas sociais nas décadas de 40-50 , do século passado. A mulher,  chamada de Begun Agha Khan mandou erguer o mausoléu e me parece que seus restos também se encontram ao lado do marido. Eles possuiam casa de veraneio na ilha onde foi enterrado e vinham anualmente da Europa, onde moravam a maior parte do tempo, para usufruir da tranquilidade e beleza daquele canto do Egito.

Prossigamos , pois aquele iluminado dia ainda nos reservaria  muitas emoções. Iluminado, como quase todos os dias naquele exótico e encantador pedaço do norte da África.
A Van nos levou por caminhos tortuosos até uma localidade de casas baixas e coloridas, beirando a represa. Paramos primeiro junto a um grupo de  camelos e seus guardadores. Depois de rápida negociação Amro nos mandou subir no bichão e deu uma série de instruções, não muito bem assimiladas. Isto porque na hora que a enorme criatura botou-se de pé quase voamos de cima de sua garupa. É que o animal ajoelha e, depois, para se erguer dá um impulso para trás. Quem não está se segurando bem pode ter uma desagradável surpresa. Depois de nos reequilibrarmos (sim, porque decidimos usar um camelo só no passeio), rumamos para o povoado Núbio. Aquilo é que poder-se-ia chamar de "pagar mico".


A gente corcoveando encima do animal e passando por sobre as janelas das casas, das lojas e dos armazéns. Só dava "nós". Juro que estava envergonhada, me sentindo ridícula. As pessoas saiam para ver aqueles dois turistas,  sabe Deus vindos daonde, para quebrar a monotonia do lugar.
Finalmente paramos diante de uma casa azul clara  e fomos recebidos na porta por uma bela mulher núbia, sorridente (sorriso no. 1, para turistas, segundo o guia), que nos levou para o interior da morada. A sala era bem grande, mobiliada com poltronas de vime forradas de uma tapeçaria artesanal e com almofadas jogadas sobre elas.


 Fomos apresentados ao marido, creio eu,  e a seguir  para as crianças. Essas eram tímidas mas o menino veio no meu colo. Isto por sugestão do guia, pois em razão das diferenças culturais eu,  em países estrangeiros,  nunca tomo iniciativas deste gênero.
Na casa, apresentada como a típica morada dos núbios, também se vendia artesanato, principalmente bijuterias e colares. A mulher colocou um no meu pescoço,  como presente. Depois sentamos para o chá e para o primeiro contato com nossos amigos CROCODILOS. Os poços que víamos na sala  eram , nada mais, nada menos que criatórios dos répteis. O dono da casa retirou um do fosso, amarrou a sua boca e veio com ele na minha direção. Eu entendi que era para fazer um carinho e atendi, só para não fazer desfeita.



Mas  na verdade eles esperavam que eu pegasse no colo aquele adorável bichinho!!!!. Foi uma novela e acabei cedendo muitos treinos e  muitos gritos depois. Eu estava literalmente aterrada.
Todas as casas núbias têm crocodilos como bichos de estimação, pois acredita-se que eles afastam o mau-olhado. O do fosso principal, naquela fresca sala, era enorme. Havia uma grade de ferro na boca do poço para evitar possíveis acidentes.Mas eu fiquei, nas minhas ilações fazendo ligação entre um certo deus de nome Sett e aqueles animais de estimação.......


Saindo da casa fomos caminhando a pé  em direção ao mercado. No entanto desviamos um pouco para visitar uma Madrassa ( escola islâmica). Lá fomos recebidos  pelo Mestre, vestido numa impecável e engomada galabiah branca. Sentamos numa das carteiras escolares onde tivemos lições  de árabe e Núbio. Tivemos que escrever nossos nomes e outras palavras ensinadas pacientemente e eu acho que me saí muito bem, pois não fui penalizada com a palmatória. Já o Toninho teve que expor suas máos...
No mercado Amro nos apresentou aos amigos Mohamed e  Muhamed. Adorei o layout do seu armazém de especiarias, mas tudo era muito caro e eu não pretendia trazer temperos de tão longe, não fazia sentido. Mas finalmente Toninho foi convencido a comprar açafrão vermelho e chás. O açafrão custa caro lá também, mesmo depois de regatear uma meia hora para cumprir o ritual.


Dali partimos para o centro de Assuan para visitar a catedral Copta.
A Catedral é nova, tem o mesmo estilo das igrejas católicas, mas com ícones (figuras pintadas, nunca estátuas). Os coptas são próximos dos ortodoxos, imagens tri-dimensionais são consideradas heréticas.
Interessante que no átrio da Catedral, no mesmo edifício, mas antes da entrada, existem oficinas de artesãos, tanto de arte sacra como profana.



 Voltamos para o barco.
Naquela mesma noite tínhamos  um show de dança do ventre, agendado.  Quando chegamos ao nosso hotel flutuante, encontramos um homem vestido de dervixe. No traje o que se sobressaía era o saiote “godê”, bem  armado. O rosto do homem estava  pesadamente pintado, parecendo uma drag queen.  Haviamos programado assistir a uma dessas estonteantes dança dos dervixes, como ritual religioso, no Cairo. Mas não sei porque cargas d´água os guias da Capital nos desestimularam.  Disseram que haviam trocado o dia da apresentação. Não ficou muito claro , mas perdemos o show no Cairo.No entanto,  como o que tem que ser, será... não saímos do Egito sem ver o show, e nessa noite  fomos agraciados com uma bela apresentação individual. Durou de 30 a 40 minutos,o dançarino girava frenéticamente para um lado só. Eu comecei a ficar zonza, de vez em quando dava uma giradinha no pescoço para ver se estava no lugar. Eles, porém,  tem técnicas para controlar a tontura e evitar se estatelar no chão. Notei que  o dançarino dava umas  freiadas com a cabeça, e o fazia de um jeito quase imperceptível. 
Depois do Dervixe, a mulher que o acompanhava começou a dança do ventre. Era uma bela mulher, alta, clara também, traços árabes fortes. Aparentava estar de biquini, mas na verdade vestia uma roupa inteiriça cor da pele por debaixo do mesmo, atendendo aos costumes mais conservadores. Era roliça e sua barriga não era propriamente de tanquinho, ao contrário,  era arredondada. No início estranhei, mas depois fui achando bonito, conforme  o desenvolvimento da performance. Ela entusiasmava a platéia e se dirigia às cerca de  15 pessoas que a assistiam para que batessem palmas e acompanhassem o ritmo...O dia  fechou com chave de ouro e pôs um ponto final no nosso passeio pelo Rio Nilo e seu mítico Vale. Acabou...

Acordamos cedo e fomos para o  aeroporto rumo ao Cairo, para um dia a mais na Capital Egípcia, antes dos nossos próximos destinos: Jordânia e Israel. Sobre estes  passeios já falei neste blog por pura impaciência de esperar a ordem dos nossos deslocamentos. Ainda falarei sobre o Egito e mais um dia no Cairo, talvez na última postagem sobre a viagem ao Oriente Médio. Até lá...


segunda-feira, 17 de outubro de 2011

CRUZEIRO NO NILO - OUTROS TEMPLOS E CIDADES AO LONGO DO RIO

Logo após o café da manhã, saímos para uma visita ao templo de EDFU. A cidade foi das mais marcadamente árabes que eu vi nesta viagem. Os homens usavam as tradicionais galabias (espécie de camisolão) e as mulheres os saris e véus, muitas usavam burca. Não vi pessoas vestidas à moda ocidental. Tomamos uma charrete puxada a cavalo e fomos visitar o templo que ficava a cerca de 20 minutos do pier.

Fomos orientados a não falar com o condutor. Parece que os charreteiros são hostís aos turistas. Não havia nada a dizer a ele exceto que parasse de usar aquele maldito chicote contra o animal cansado e suado, fazendo o duro serviço de transportar três pessoas sob o sol escaldante .


O animal voava pelas ruas empoeiradas de Tell Edfu (nome atual da cidade). Juntando o sacolejar da carruagem (tava mais para abóbora), com a poeira e o calor, eu não diria tratar-se de uma condução  confortável. Apenas exótica. Era um tal de cruzar com outras charretes pelas ruas cheias de transeuntes e sempre todas a toda velocidade. Lembrou da minha infância em Blumenau, pois a cidade tinha charretes de aluguel, chamadas de carro de mola. Bem...voltando ao Egito...
Finalmente chegamos aos arredores do templo. O monumento, também chamado de templo de Horus é enorme e dos mais bem conservados do País. Horus é o deus-Falcão.



Edificado com  pedra arenosa (arenito) é também repleto de inscrições, altos e baixos relevos. O templo como se apresenta atualmente é identificado como tendo sido erigido no período Ptolomaico, 237 A.C.,   mas há vestígios de que tenha sido construído sobre outros ali existentes anteriormente. Parte desse complexo encontra-se sob as casas próximas dos moradores.



Tentando descrevê-lo comecemos pela entrada monumental. Trata-se de um pórtico gigantesco, de linhas limpas, apontando para o infinito azul. Na verdade esse portal é constituído de duas torres, os chamados pilonos. Na foto acima, ao fundo, vê-se as imagens do deus Horus diante de cada um dos pilonos. Eles se tornam pequenos diante da majestade da construção que guardam. Compare agora com a outra foto anterior para imaginar as suas  reais dimensões. Segundo pesquisas efetuadas os pilonos medem 37m de altura.
Entalhados na fachada encontram-se as figuras de Horus, Hathor, Isis e Osiris, bem como a do faraó (Rei) Ptolomeu VIII  fazendo oferendas a esses deuses. 
Após o vestíbulo há um pátio com 32 colunas, todas encimadas por capitéis esculpidos com as plantas típicas do país, principalmente  flor de lotus e papirus.


Na sequência  passa-se pela sala da biblioteca, onde eram guardados os documentos do templo. Depois outros cômodos que dizem, teriam sido usados para armazenar utensílios e objetos para oferendas. No hipostilo,  o que se sobressai negativamente é o teto enegrecido pela fuligem de velas e lamparinas. Tais manchas foram deixadas pelos cristãos no período em que ocuparam o local e  estabeleceram ali sua igreja.



Prosseguindo-se na exploração chega-se a a uma sala, isolada por uma corda, onde só é permitido apreciar o seu interior através da porta. Logo se sobressai a barca sagrada, mas logo atrás há um sacrário dedicado a Horus e muitas inscrições nas paredes laterais (tudo como se vê na foto abaixo).


Há muito o que se  ver no templo principal e nas construções próximas. Por exemplo, do lado esquerdo há um templo menor, chamado Mammisi,  dedicado ao deus Horus. Nas suas paredes encontra-se representado o nascimento do deus, a fase de sua amamentação  e episódios da sua infância. Edificado no período greco-romano compõe-se do vestíbulo, um santuário e salas adjacentes.



Outra das obras que remanescem e que são interessantes de se visitar é o Nilômetro, que é  um túnel com acesso ao Rio , através de escadas.
Servia principalmente para as medições do volume das  águas, o que era de fundamental importância para as populações. Como se sabe, antes da construção das grandes represas  e por todo o sempre as cheias do Nilo traziam fertilidade natural ao solo e permitiam o cultivo e a sobrevivência daquela maravilhosa civilização.

Hoje as represas regulam as cheias e os ribeirinhos cultivam usando adubos e fertilizantes artificiais. Imagino que sem nenhum planejamento e cuidado.What a pity!

KOM OMBO

Saímos de Edfu no meio a tarde e singramos as águas tranquilas do Nilo até Kom Ombo. O templo fica ás margens do Rio e a sua proximidade impacta.

Foi o tempo do navio lançar âncoras e nós sairmos a pé para visitá-lo, sob a luz do poente. Passa-se por um cais do porto bem cuidado, com restaurantes e lojas de souvenirs. Sobe-se uma escadaria e tem-se a frente o belo templo dedicado a Horus, o deus falcão e a Sobek, o deus crocodilo.

 É o único templo no país dedicado a dois deuses simultaneamente e ajustados com simetria (um lado para cada um). Para justificar este compartilhamento conta-se que o deus Amon teria sido salvo pelo deus crocodilo, numa batalha ali nas próximidades, no rio Nilo. Que por gratidão Amon teria mandado erigir o templo em sua homenagem, mas tendo em vista que Sobek era guerreiro e não teria aquela popularidade entre a população, colocou-se  para compartilhar as oferendas e atrair o povo o Deus Horus, amado e cultuado pelos habitantes do lugar.
A construção do belo templo começou no reinado de Ptolomeu IV (período greco-romano) e contava além do prédio principal e de outras obras, com um fosso em que se criava um crocodilo, além de

um nilômetro (túnel com acesso ao rio para medir o nível das suas águas).
Mesmo tendo sofrido com as enchentes no passado e sendo objeto de depredação para que o material servisse a outras obras, este templo acabou abandonado e ficou coberto de areia por muitos anos o que justifica o seu atual bom estado de conservação.


Os relevos  deste templo são instigantes porque nos expõem os usos e costumes da época. Na foto abaixo voces podem ver o detalhamento de um parto de cócoras. As inscrições nos mostram também os instrumentos cirúrgicos semelhantes aos usados nos dias atuais. Os egípcios, podemos relembrar, foram os primeiros a fazer as trepanações ou cirurgias de cérebro, portanto eram avançados na ciência  da medicina.


A noite caiu e trouxe com ela mais beleza e plasticidade aquele cenário encantado.

Acima o deus Ra (o disco solar) pondo-se na margem ocidental, ou dos mortos.
O templo iluminado com lâmpadas amareladas dava mais vida  e realce aos tons-terra da contrução.




Estava na hora dos preparativos para o jantar típico oferecido na cobertura do nosso hotel flutuante.
Devidamente paramentados para a ocasião subimos  ao convés. O jantar foi alegre porque os egípcios são alegres e a comida era saborosíssima: homus, que eu amo e tantas outras iguarias. Mas o melhor era a sobremesa...meu Deus o que era aquilo! Fiz questão de tirar uma foto com o chefe pâtissier, que se tornou meu amigo e sempre me informava sobre novos sabores, principalmente  os doces de côco, meus preferidos..hummmm.

Minhas homenagens e admiração a ele com aqueles doces de pistache, nozes, chocolates belgas...and so on. Perdição total. Ai a balança!
Com tão boas sensações fomos dormir e sonhar com as maravilhas que o dia seguinte proporcionaria. E proporcionou. Vamos então nos encontrar em Assuan.

sexta-feira, 7 de outubro de 2011

NO VALE DOS REIS E DAS RAINHAS

 (réplica da mumia de Tutankamon, da ilha dos Faraós no centro do Cairo)
A maldição de Tutankamon caiu sobre nós mesmo antes de visitarmos sua tumba ( patrimônio da humanidade pela Unesco). Na noite anterior à visita tão esperada aos túmulos reais Toninho ficou com uma  febre preocupante e passou mal toda a noite. Nem raiara o dia e eu já havia me socorrido com  a recepção do barco para pedir um médico. Nós estávamos ligados sempre na BBC, nossa conexão com o mundo ocidental, e as notícias da bactéria na Alemanha matando gente me deixou de cabelos em pé. O médico egípcio veio logo e trouxe a medicação com ele. Foi muito gentil, atencioso e sobretudo resolveu o problema. No entanto, Toninho ficou de cama e com pesado remédio para dormir. A consulta foi cobrada em Euros , mas absurdamente barata, pois incluía antibióticos, antiespasmódicos  e o poderoso sonífero.. ( cerca de 65 Euros).
 O guia, tendo conhecimento  dos dissabores por que passávamos subiu até a cabine para ver como estava indo o paciente e dizer que estava ao meu dispor para a visita ao West bank. Eu estava indecisa, preocupada, não tinha vontade de me afastar dali, mas fui convencida. O doentinho iria dormir toda a manhã e o pessoal do navio daria o apoio necessário, caso precisasse. Iria ficar bem cuidado. Então eu fui sozinha, com o guia e o motorista: os gentis Saladino e Ahmed.
Assim sacolejando na Van saímos rumo ao deserto escaldante. Depois de cumprirmos as revistas de praxe entramos no  grande cemitério de reis e nobres.


Os espaços são amplos, muitos túmulos estão fechados à visitação. Visitei  apenas dois e fui aconselhada a não ver o de Tutankamon porque nele só se encontrava  a mumia do faraó, quase sem adornos. O tesouro  que o acompanhou em seu túmulo ( e que por sorte não foi saqueado), encontra-se no Museu do Cairo, e já o havíamos visto. Aliás, só a máscara mortuária pesa 140 kg de puro ouro, uma maravilha.
 (réplica na Ilha dos Faraós no centro do Cairo)

Então penetramos no recinto, contornando a montanha, rumo ao tumulo de Ramsés IX , faraó que governou de 1129 a 1108 AC e  cujas realizações são vistas apenas,  em Karnak. O túmulo tem corredores longos que se abrem no seu final numa sala oval onde ainda se encontra o sarcófago. O trajeto é feito em descida e vai se aprofundando para o coração da montanha. As paredes são vivamente pintadas e trabalhadas, representando o faraó, em oração ao Deus Sol ( Ra) , rituais funerários , soldados, escaravelhos, batalhas, cortejos e outras cenas  da vida e da morte ,  muitas reproduções das figuras dos deuses e faraós, principalmente o morto, como se fossem feitas há poucos anos e nunca do alto dos seus dois milênios.
O tumulo de Ramsés IV continha também uma câmara  para o último descanso do corpo do  seu filho criança (falecido aos  cerca de nove anos). As paredes e nichos são cheias de  inscrições, altos e baixos relevos,  desenhos, hieróglifos. Aquilo mexeu muito comigo porque eu ficava imaginando os que desenharam aqueles símbolos ali, o que pensavam, como viveriam, seriam escravos ou artistas, ou simples artesãos cujo ofício seria entalhar as tumbas para receber os ilustres mortos. Que técnica empregada na fixação daqueles pigmentos perenizava aquelas cenas ...para que eu e todos os outros visitantes pudessemos chegar dois mil anos depois e apreciar aquilo, interpretar o modo de vida deles e suas crenças?..Inevitável a comparação com a nossa cultura nacional de ignorar a própria memória, inclusive para acontecimentos mais recentes.
Vejam que eu quase não tenho fotos deste local...estava também preocupada com o meu personal patient.
Dali tomamos a condução para o outro lado da montanha onde estava encravado solitária e espetacularmente o templo da Faraona HATSHEPSUT. Passamos pelos túmulos mais recentes, bemm simples como se vê da foto abaixo.


 O  carro ficou no estacionamento, mais distante, e em seguida tomamos um coletivo ( ônibus elétrico, similar aos trenzinhos do estacionamento da Disney) que tranportava aos portais do enorme e belo templo. A visão era surreal, lembrava um enorme espaço teatral , com o palco ao fundo e seu irreparável cenário.

Hatshetsup foi a única  faraona do Egito. Ela precisou usar de ardis para subir ao trono pela sua condição  de mulher. Toda esta saga está cravada nas paredes do templo. Você deve estar curioso para saber como ela conseguiu a façanha. Pois bem, satisfaço esta curiosidade: ela , com o apoio de sacerdotes, tratou de convencer o seu povo de que era mais do que humana pois sua mãe teria sido emprenhada pelo deus Amon-Ra. Como deusa ela convenceu seu povo de que poderia chegar ao posto máximo  pela vontade de seu pai deus. Assim superou as pretensões de seu sobrinho Tutmés, que só veio a assumir o poder após 22 anos de reinado da tia e assumiu a dignidade do cargo com  o nome de Tutmés III. 


Este monumento portentoso começou a ser erigido durante o reinado da própria faraona ( oitavo ano). A sua grandiosidade deixa transparecer a necessidade que ela tinha de se sobressair aos faraós seus antecessores pelo fato de ser mulher. No entanto essa conquista nunca foi usada a favor do gênero porque ela agia como homem. A apresentação de sua figura é mais masculina que feminina. O peito era largo e musculoso, assim como os braços. Usava aquela tradicional barbicha em forma de trança. As roupas não eram femininas também e como os homens usava o dorso seminu.
Voltando ao templo, ele foi construído em três patamares, e era destinado ao cerimonial da morte ( embalsamamento do corpo e mumificação) . Consta de várias capelas dedicadas aos deuses Amon, Anúbis, Ra-Hor-Akhti e Hathor.
No último piso ( os três construidos são acessados por rampas), encontra-se a ligação com o Vale dos Reis onde ficava , propriamente, o seu túmulo.  
Com a sua morte por infecção nas gengivas* aos 37 anos,  o parente sucessor tratou de dismistificar a sua figura e danificar, o máximo que pode, seus bustos e borrar sua imagem dos afrescos e pintura em que aparecia. Fez subsituir em muitas delas a figura da tia pela sua.Em outras nem se deu a esse trabalho, simplesmente desfigurou o rosto com cinzel ou outro objeto pontiagudo. 
Como eu não tenho compromisso com roteiros ( aliás no local você terá acesso aos mapas e os guias contarão todas as histórias e destacarão todos os deuses,  capelas e imagens  pela ordem certa desde a entrada), pretendo falar apenas dos pontos que mais me atrairam Assim,o conjunto de colunas da Capela de Anubis, em número de 16 e que  seguram o teto de um azul vibrante, cravejado de estrelas amarelas,  me impressionou e é digno de nota pela  conservação do colorido.

 Também a destacar os impressos nas paredes, como a figura da mãe engravidada pelo  deus, o transporte de dois  obeliscos, desde Karnak, a construção das barcas solares. Interessante ainda os detalhes da  expedição comercial dos egípcios a Punt, nas vizinhas terras do país , hoje conhecido como  Sudão. Registrou-se dessa viagem  a troca de mercadoria,  incenso, marfim e outras riquezas abundantes no local por jóias e armas oferecidas pelo visitante. A rainha anfitriã é retratada como uma pessoa obesa. São detalhes que tornam as informações sempre muito interessantes.
Nas paredes do templo as figuras reais ali estampadas, quer seja Hatshepsut ou Tutmés , estão sempre  acompanhadas dos deuses que lhes davam proteção, como a Deusa Hathor ( com orelhas de vaca), Horus, o deus falcão e outros.
A visita turística pode demorar cerca de 2 horas, se você se ater apenas a alguns detalhes , mas poderia levar dias para decifrá-los todos, se fosse ali com visão de historiador. Bem, não era o meu caso, não consigo parar horas a fio e ver todos os pormenores de cada desenho e de cada  cartucho e assim me ative  às coisas mais chamativas e as  destacadas pelo guia.

De todo modo eu estava no meu limite de tempo pois necessitava voltar ao barco. Pelo caminho ainda passamos pelos Colossos de Memnon, que são duas estátuas de 18 metros, situadas na necrópole do antiga cidade de Tebas e representam o faraó Amen Hotep III ou Amenófis III ( XVIII Dinastia). O templo que guardava foi destruído pelas cheias do Nilo e por saques.

Estas estátuas ainda possuem no lado de cada perna as figuras da mãe e da esposa principal. Os colossos estão muito desgastados e mal conservados. Há tempos em decorrência de um terremoto sofreu uma fissura e passou a emitir sons ao amanhecer, o que  gerou superstições.Ao final foi constatado que os fenômenos atmosféricos eram responsáveis pelas manifestações das imagens ( frio da noite, calor da manhã, essas coisas) Com a sua restauração as estátuas pararam de gemer.
Ao retornar ao navio encontrei tudo calmo e o doente ainda dormia. Almocei e o barco foi seguindo o seu rumo Nilo acima - no sentido  coração da África. Aproveitamos a tarde no convés vendo a vida passar morna e preguiçosa ao longo do curso do Nilo.

Também  ficamos entretidos com a passagem pelas comportas, que trouxe várias figuras locais para perto do navio a gritar para que jogássemos comida ou dinheiro.Todos homens vestidos em suas galabias. 


A noite  houve o famoso coquetel do comandante no salão nobre do barco e a chegada a EDFU, matéria de nossa próxima postagem. Arriverderci.


* Pesquisa extraída da Wikipidia: "Tendo em conta que o nome de Hatchepsut foi suprimido das principais listas de reis do Antigo Egipto, desconheceu-se durante muito tempo a existência de Hatchepsut. Em meados do século XIX, quando a Egiptologia se estruturou como campo do saber, iniciou-se a redescoberta da rainha-faraó. Em 1922-1923 o egiptólogo Herbert Winlock, que realizava escavações em Deir el-Bahari na área pertencente ao rei Mentuhotep II, encontraria uma série de estátuas de Hatchepsut. Uma parte destas estátuas estão hoje no Museu Egípcio do Cairo e no Metropolitan Museum of Art. Recentemente a múmia de Hatchepsut foi localizada através de uma pesquisa que contava com testes de DNA, tomografia computadorizada, entre outras 2 múmias, e um grande mistério que envolvia sua morte. Através de um dente molar, encontrado em uma caixa mortuária de madeira e com seu nome entalhado, que também continha seu fígado mumificado, foi possível afirmar que uma das múmias em questão era a de Hatchepsut. Cientistas descobriram também que sua morte foi devido a uma infecção na gengiva"
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