sexta-feira, 18 de setembro de 2015

MEDOC

O pacote que escolhemos para a imersao no Medoc (que abrange os vilarejos e as fazendas das comunas de Pauillac, Margaux, St Julien e St Stephen) foi de um dia. A visita seria a 3 chateaux grand crus, escolhidos pela empresa prestadora do serviço. A região, saliente-se, é a menina dos olhos de Bordeaux, pois produz os melhores vinhos da região, de acordo com a classificação oficial de 1885. 
Acordamos cedo, fizemos aquele fantástico café matinal com canellés(inclusive), e fomos para a Place des Quinconces. A calçada diante do Oficce de Tourisme estava lotada, havia vários grupos. E isto começou a me deixar preocupada, porque os programas de massa costumam ser superficiais e aborrecidos. Mas para espanto nosso apareceu um senhor com uma prancheta,  perguntou pelo nosso sobrenome ( M. e Dame Gonzalez) e pediu para que nós o acompanhássemos. Havia outras 4 pessoas esperando. Após as apresentações iniciais tomamos uma Van. Foi um alívio. O guia falava francês e inglês e era muito simpático. Isto faz a diferença. Os turistas que estavam conosco eram duas moças da Austrália e um casal do Canadá, igualmente cordiais. 
O dia estava ensolarado. Não demorou muito para encontrarmos as primeiras plantações com seus casarões. No caminho com destino a Pauillac passamos no Chateau Margaux. 


Chateau Margaux


Linda aléia até a entrada do casarão. Tiramos fotos apenas. O magnífico Margaux não estava incluído na visita. Mais adiante, já em St Estèphe   paramos para uma aula no meio da vinha, no belo e premiado Chateau Cos D'Estournel. 


Descemos para caminhar através do alinhamento da plantação.O agrônomo até aproveitou para examinar o solo, os pés de uva e outros detalhes que passam despercebidos para um leigo.



Também aproveitamos para tirar fotos na frente do Castelo, que tem traços da arquitetura indiana. Mas foi apenas um refresco. As visitas às caves e outras vinhas, em pormenor, viriam depois. Uma espiada no Pichon-Longueville era imperdível porque com suas torres, remexe nos contos da infância, de princesas e bruxas, reis e rainhas. 
Chateau Pichon Longueville
Mais à frente encontramos o Chateau Lafite-Rotschield. Sem conhecê-los, mesmo que assim, de relance,  o  passeio não seria completo.

Chateau Lafite- Rotschield, ao fundo


Bem já passava do tempo de visitar a vinícola programada para Pauillac: HAUT BAGES LIBERAL  - www.hautbagesliberal.com situada no Chemim de Balogues, perto do rio Gironde. Ah O Gironde, mereceu uma parada para apreciar seu lado rural.


 A vínícola, com vinhos de grande prestígio está entre as mais bem cotadas da região, tendo constado da classificação de 1885, com Vinhos Second Grand Cru. Logo que chegamos fomos recepcionados já no lado de fora pela enóloga que nos mostrou as vinhas e falou das fases do cultivo, do controle do crescimento da planta através da poda e do formato e da disposição de cada pé e do conjunto (que estão dispostos em fileiras e não em parreiras suspensas), do solo, do microclima e da insolação. Em rápidas pinceladas, o tamanho, formato da vinha e a enfileiramento são para reduzir a produção e concentrar todas as qualidades em poucos frutos (acúcares, líquido, crescimento, coloração etc..). Alinhadas,  e não tendo como suporte as parreira convencionais por outro lado, facilita o  manejo, inclusive no que diz respeito a controle de doenças e pragas. Sobre o solo ela informou que ali é predominantemente calcáreo, pedregoso e arenoso. A uva quanto melhor mais tem que sofrer, buscar seus nutrientes no fundo da terra inóspita (é o que sempre ouvimos e que foi confirmado). A grande quantidade de pedregulhos e a sua constituição com bastante mica conservam o calor sobre a planta por mais tempo. Isto porque em se considerando que o local tem noites frias, o calor é muito importante para o crescimento dos frutos, principalmente em se estendendo até a noite. O clima em geral também é fundamental, nada de excesso de chuvas. Águas em períodos intermitentes são o ideal. É preciso que os dias sejam mais longos e não obrigatoriamente ensolarados, como característico neste região.  A guia falou ligeiramente sobre a vindima, modo de separar cachos mais maduros de outros no ponto. A colheita é manual, revelando um processo artesanal cuidadoso, que garante um produto de excelência. 





As cepas que mais se adaptaram à região e que são as mais usadas na elaboração de vinhos no Medoc ( incluso esse Chateau) são: cabernet sauvignon, cabernet franc, merlot, petit verdot e malbec.
Encerrada a primeira etapa da visita e já na parte interna, fomos apresentados aos enormes barris de inox, e introduzidos no processo de vinificação. 



Foi explicado que logo depois da colheita passa-se à operação "desengaço" que é a retirada dos frutos do cacho e a separação do esqueleto que, se fosse juntado ao suco iria conferir a este um gosto amargoso e indesejado. O debulhamento é feito por máquinas desengaçadoras. A prensagem para extrair o precioso líquido é rápida e o produto é levado para as cubas. Ali permanecendo por dias e até no máximo um mês. Foram mostradas as cubas e a enóloga explicou sobre o processo de fermentação, que ocorre com o rompimento dos bagos e o seu contato com a casca, o ar e com os açucares. A dos tintos se faz com a casca, já que sua cor e textura produzem diversas influências no sabor do produto final. O vinho branco ,diferentemente, é prensado com a casca, mas esta é separada antes da fermentação, para onde só é levado o suco. Portanto uma uva tinta pode fornecer um vinho branco, tudo vai depender da orientação na hora de fermentar. As torneirinhas abaixo dos tonéis vão ser responsáveis pela próxima etapa. Quando abertas retira-se o sumo mais fino que é colocado numa cuba. O mais grosso vai para uma segunda cuba. Aí ocorre uma nova fermentação. Por fim, como  o sumo ainda sai turvo dessa última operação é preciso extrair a borra acumulada, para que esses resíduos não produzam mais uma fermentação que seria danosa ao produto. Esta etapa é chamada de clareamento, que nada mais é que se fazer a limpeza do líquido. Bate-se claras de ovo em neve e despeja-se no barril (são seis claras para cada barril de madeira). A sujeira vai aderir às claras ficando mais fácil para retirá-la. É um método histórico e lendário até, eu diria, mas ainda utilizado, por ser eficaz e porque vai excluir tratamento químico ou mesmo físico (centrifugação)que prejudicam a qualidade do vinho. Como curiosidade eu acrescento a informação de que a colagem (este tipo de clareamento) permitiu a criação de doces, sendo os mais famosos os canelés, para aproveitar a gema que sobrava. 


As cubas acima, de aço inoxidável tem se sobrepujado a outros materiais porque são mais fáceis para higienizar. 
Cave do Chateau Haute Bages Liberal


Depois das cubas eles são transferidos para as barricas de carvalho. O vinho ainda passa por aeração e pela sulfitagem, que é o acréscimo de enxofre, que vai proteger o vinho de doenças. Uma operação regulamentada em lei e que consiste na inclusão deste elemento que vai propiciar a famosa dor de cabeça aos consumidores. Mas não há outro jeito. O produto químico em questão tem qualidades antioxidantes e bactericidas e precisa portanto integrar a composição do precioso líquido. Nos barris de carvalho o vinho vai ganhar aromas e sabores, vai arredondar, amaciar os taninos (aquela adstringência sentida na boca ao tomar a bebida). 


Bem, há muito mais o que se falar, que poderia abranger o engarrafamento e as garrafas, rolha, tonéis de carvalho (os novos e os velhos), outros cuidados durante a vinificação. Mas acredito que foi uma mostra de tudo o que foi conversado e os enólogos estão abertos para esclarecer todo o tipo de dúvida que o visitante tiver. 
Passamos à sala de degustação, momento muito esperado. Mostramos abaixo os momentos da "solenidade".

Degustação Chateau Haut  Bages Liberal -  Pauillac
O nosso pequeno grupo se espalhou pela sala para experimentar dois vinhos selecionados pela vinícola. Um ambiente destes é sempre muito agradável, por isto estou colocando mais fotos do que normalmente faço.





Confesso que ninguém teve tempo de analisar cores e sabores, mas tudo foi comentado pela enóloga, sabendo que todos eram neófitos, mas bom apreciadores desta bebida consagrada que vem sendo aperfeiçoada ao longo do tempo. 


Como tudo que é bom acaba rápido, esse chegou logo ao fim. Então partimos para Pauillac para o almoço. Sua rua principal fica diante do rio, com jeito de mar. Dali partiu o Duque de Lafayette para libertar os Estados Unidos da Inglaterra e há um monumento em homenagem. Fizemos uma caminhada ao longo do cais e depois fomos para o restaurante, numa sala reservada para o nosso grupo. Um momento pra lá de agradável, conversa fluindo muito bem, misturando inglês e francês. 
Restaurante Le Vignoble - France et Angleterre
O almoço prestigiou os produtos da mesa bordalesa: frutos do mar, foie gras e muito mais. 
Saindo do restaurante  a próxima etapa era a visita ao Chateau Gruaud Larose em ST Julien : www.gruaud-larose.com. Este terroir tem como característica um solo ácido e predominam os cascalhos. Ali se produzem Grand Crus Classés,  famosos por sua delicadeza e finesse.  Lindos jardins, tudo muito organizado.


Chateau Gruaud Larose

Os vinhos embalados como perfumes, dão a idéia da sofisticação e da delicadeza na produção da bebida. 



Primeiro fomos ao terraço suspenso, onde se pode apreciar a propriedade com as casas e o vinhedo.Uma linda vista. 



Lá conhecemos um jovem brasileiro que trabalha como guia. 
Depois passeamos pelos jardins, visitamos a Cave e tivemos novas aulas sobre o binômio vinha-vinho. 

Mas havia ainda tanto para ver que pretendo partilhar estas belezas.



Aulas com o guia oficial da Vinícola.







Acima as escadarias que trazem à fantástica adega.








É um passeio inesquecível, que terminou com a objetiva e muito real degustação, sempre de dois vinhos Grand Crus Classés. 

Finalmente vejam a adega com seus vinhos preciosos:



O último Chateau visitado foi o Kirwan: chateau-kirwan.com - endereço: Margaux - Cantenac - France. 




Também está entre os mais nobres, com vinhos classificados como Second Grand Crus. Lembrem-se que os primeiros são os Lafite, Margaux, Latour e outros ultra célebres e caros, mas que esta classificação dá a dimensão da categoria dos vinhos ali produzidos. 

O Chateau Kirwan tem belos jardins de gramas e roseiras. O casarão é antigo e tem ares românticos.






 A enóloga era uma chinesa, muito  eloquente e também simpática. Deu nova aula junto às vinhas e fez todo o circuito dos demais. O que foi bom para fixar os ensinamentos. Ao final, na degustação foram servidos o Chateau Kirwan, Schröder & Schÿler - 2011, Grand Cru Classé e Charmes de Kirwan - 2011. Além dos vinhos excelentes ainda fomos mimados com canelés ( me perdoem os portugueses, mas eles lembram bem os pastéis de Belém).




Não deu pra sair bêbada, porque a degustação era controlada e ainda se podia despejar o conteúdo em pias com água corrente. Eu acabei fazendo isto. Nunca imaginei que pudesse um dia desperdiçar uma gota que fosse de um vinho desta estirpe! Tudo uma questão de limite. Cada um sabe o seu e o momento de parar. 
Rememorando, muitos souvenirs relacionados ao vinho podem ser comprados na sala da recepção. Nunca resisto aos aventais de "Chef" e alguns presentinhos para familiares, como conjuntos de abridor de vinho combinando ou com panos de prato ou com aventais. Além da bebida,claro.
E assim acabou nosso dia numa das  regiões mais emblemática da França.  Salut e au revoir. Nos encontraremos a caminho dos Alpes nas próxima postagem.  

Um comentário:

  1. Depois dessa aula, me deu até vontade de tomar um vinho.
    Muito bom!

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